Noite de Passagem de Ano. O pai teve de arrancar para a fábrica antes das dez pelo que jantámos bem mais cedo do que o habitual. Que havemos de fazer até à meia-noite? Uno Attack? Boa ideia,
vamos a isso. O primo Manel é muito pequeno para jogar por isso fica com a função
de carregar no botão do lançador de cartas. A coisa corre estranhamente bem. Tão bem que a Té insiste em repor sistematicamente o baralho no lançador tornando o jogo
interminável. Ao fim de quarenta e cinco minutos eu peço ao Tommy para me
substituir. O jogo acaba pelas onze. Parece que ganhei. Está visto que para ter
sorte preciso mesmo de ter alguém a segurar nas cartas por mim.
E agora, que fazemos? Esperamos. Já só falta uma hora. Uma hora passa num instante.
E agora, que fazemos? Esperamos. Já só falta uma hora. Uma hora passa num instante.
“Mãe... quando é que vamos para casa?”
“Quando for meia-noite.”
“Só?!”
“Ti, já te disse que é noite de passagem de ano. Temos de esperar
pela meia-noite. Brinca mais um bocado.”
“Já não sei a que brincar.”
“Joga qualquer coisa no meu iPad.”
“Não posso. O Tomás está com ele.”
“Tommy! Não instales mais jogos no meu iPad se fazes favor…”
“Não é um jogo, mãe. É uma coisa importante.”
“Que coisa importante?”
“Depois vês, ok?”
Dou meia volta e vou até à sala onde avós, bisavós, tios e primos
conversam animadamente.
Onze e meia. Talvez seja melhor começar a tratar das passas e das uvas (para os que,como eu, não comem passas). Conto três dúzias de uvas que coloco em três copinhos.
Onze e meia. Talvez seja melhor começar a tratar das passas e das uvas (para os que,como eu, não comem passas). Conto três dúzias de uvas que coloco em três copinhos.
“Meninos, segurem aí nas vossas uvas.”
O Ti agarra o copo, espreita para o fundo e resmunga:
“Eu não vou comer isto.”
“Vais sim. “Isso” são uvas. Bem boas, por sinal."
“Porque é que eu tenho de comer uvas?”
“À meia-noite comemos doze uvas cada um. É tradição.”
“Tradição?”
“Sim, tradição. Para dar sorte para os próximos doze meses.”
“E se não comer todas como é que se sabe quais são os meses em que vou ter
azar?”
“Não se sabe.”
“Não tem lógica nenhuma, isto das uvas.”
Afasta-se, resignado, com o copo das uvas na mão.
Onze e cinquenta. É melhor ligar a televisão, para estarmos
atentos às doze badaladas. Na tvi, de preferência. Estas galas não são o que
eram no tempo do saudoso BigBrother do Zé Maria mas passar o ano sem a (sempre enervante) Teresa
Guilherme não é passar o ano.
Onze e cinquenta e cinco. Tudo em posição à volta da mesa. Taças
de champanhe a postos. Talvez seja melhor não subirmos para estas cadeiras que são pouco estáveis. Antes que tenha tempo de partilhar esta minha
preocupação já vejo metade da família a empoleirar-se nas cadeiras.
O Tommy surge a correr ostentando orgulhosamente o iPad onde conseguiu ligar-se ao pai via Skype. Levanto alto o iPad para que o André possa, no recato do seu gabinete, ver as caras de todos os que lhe desejam uma boa passagem de ano.
O Tommy surge a correr ostentando orgulhosamente o iPad onde conseguiu ligar-se ao pai via Skype. Levanto alto o iPad para que o André possa, no recato do seu gabinete, ver as caras de todos os que lhe desejam uma boa passagem de ano.
É agora! Dez… nove…
O Tommy começa a gritar. A cadeira (pouco estável, eu bem digo) fechou-se no momento em que tentou subir e
está com o tornozelo preso. Peço desculpa ao André e “pouso-o” na mesa. Quando
consigo libertar o pé do meu filho já está tudo a brindar e a gritar “Bom Ano!!”.
Volto ao André que passou os últimos segundos de 2014 a observar as decorações de Natal que a minha mãe tem suspensas no tecto da sala. "Bom ano, meu querido. Tommy, Té, Ti! Venham dizer bom ano ao pai!"
Volto ao André que passou os últimos segundos de 2014 a observar as decorações de Natal que a minha mãe tem suspensas no tecto da sala. "Bom ano, meu querido. Tommy, Té, Ti! Venham dizer bom ano ao pai!"
Tomás, O Estouvado, saúda o pai com aquele sorriso delicioso que só ele sabe fazer.
Teresa, A Romântica, fica agarrada ao iPad a fazer festinhas ao papá.
Tiago, O Pragmático, ainda está em cima da cadeira. Comeu só metade das uvas. Ajudo-o a descer com a conveniência de nem mencionar o costume do pé direito.
Teresa, A Romântica, fica agarrada ao iPad a fazer festinhas ao papá.
Tiago, O Pragmático, ainda está em cima da cadeira. Comeu só metade das uvas. Ajudo-o a descer com a conveniência de nem mencionar o costume do pé direito.
“Bom ano Tiago! Brinda comigo com o teu copo de uvas.”
“Brindar também dá sorte?..”
“Brinda lá e cala-te. Dá um beijinho a todos e depois veste o casaco. Agora sim, está na hora de irmos para casa."
“Mãe, só uma coisa...”
“Sim…”
“Porque é que, só por ter mudado o ano, fica toda a gente tão entusiasmada?"
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