sexta-feira, 22 de abril de 2016

"Descansa, mãe!"



Na sexta-feira o Tiago regressou do colégio com um objectivo: proporcionar descanso à mãe. Eu não sei se foi sugestão do professor, se foi um mero fruto da sua infindável necessidade de traçar novas metas. Sei que a ideia me agradou.

Imune aos olhares fulminantes do André, que estava (segundo o Ti) obrigado a ajudá-lo a ajudar-me, recebi com entusiasmo a informação de que iria poder relaxar e fazer o que bem me apetecesse pois não iria ter de me preocupar com absolutamente nada.

“Pai, temos decidir o que vamos fazer para o jantar!”

O André sugeriu que fizessem uns panados com massa. O Ti estendeu-lhe o livro de receitas do Pantagruel.

“Panados com massa são só panados e massa. Isso não é uma receita. Vamos preparar uma receita a sério.”

Uma "receita a sério" implica refogados, gratinados e afins, está visto. Pedi autorização para escolher o prato. Pasticciata da Siccilia, pág. 574. Todos gostam e, apesar de trabalhosa, não é difícil. Assim foi. Duas horas ao fogão e o jogo dos Golden State Warriors contra os Houston Rockets perdido (eu bem digo que é muito chato não haver SportTv na cozinha…) valeram uma pasticciata de comer e chorar por mais.

Fim-de-semana implica idas ao supermercado às quais todos se furtam com as mais variadas desculpas. Fiel ao cumprimento da sua missão, o meu filho não só me acompanhou nas compras como à saída da caixa fez questão de carregar todos os sacos.

“Tiago, dá cá ao menos os pacotes de leite que são pesados. Já levas muita coisa!”

“Nem pensar, mãe! Tu não podes fazer esforços!”

Sorri, envergonhada, à senhora da caixa que me sorriu de volta e me desejou as melhoras imaginando talvez que eu tivesse um problema grave de costas.

Na loja de animais o embaraço foi ainda maior quando, sem que eu tivesse tempo para o impedir, arrancou para o carro com um saco de doze quilos de ração em cima da cabeça.

A bem da integridade física do meu filho e antes que me aparecesse a Segurança Social à porta decidi não voltar a sair para comprar o que quer que fosse.

Tudo correu às mil maravilhas até ao momento em que me apercebi de que era domingo à tarde e o meu super ajudante ainda não tinha feito aquelas que são, efectivamente, as suas tarefas:

“Os trabalhos de casa?”

“Faço daqui a pouco.”

“Daqui a pouco o fim-de-semana acabou. Vai lá para o quarto e faz o que tens a fazer.”

“Oh mãe…”

“Ti…”

“Deixa só acabar este episódio…”

“Tiago Manuel, trabalhos de casa!”

“Oh mãe…”

“E banho? Não tomaste banho de manhã, tens de tomar banho.”

“Oh mãe…”

Este “Oh mãe” pode repetir-se infinitamente se eu não arranjar maneira (a bem ou a mal) de o chamar à razão. Optei por tentar tirar partido da sua boa vontade para com o meu bem estar:

“Tiago, decidiste que ias fazer tudo o que fosse possível para que eu não me cansasse.”

“E fiz!”

“Pois fizeste. Ajudaste a carregar, a arrumar, a limpar e até a cozinhar. Mas fica sabendo que estar aqui meia hora a mandar-te ir fazer os tpc e mais meia hora a mandar-te para o banho cansa-me bem mais do que duas horas na cozinha.”

Enterra-se no sofá, arqueia uma sobrancelha e faz aquela expressão que o faz parecer ter oitenta anos em vez de oito.

“Mãe…”

“Diz lá…”

“Sabes que eu quero que descanses. Se uma das coisas que mais te cansa é mandar-me fazer coisas eu dou-te uma sugestão: não me mandes fazer nada e… descansa.”


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